Ciro: Desconstruindo lendas



Sempre se diz por aí que o desempenho de Ciro no governo do Ceará no período 1991–1994 foi excepcional. De fato, foi um bom governo, sob o ponto de vista de desenvolvimento econômico, mas não na questão social, como se costuma dizer.

O PSDB governou Ceará por 20 anos, depois de uma longa era da Arena e do PDS, a Arena remodelada. Aliás, o PDS foi o partido inicial do Ciro, por conta da posição do seu pai, político do interior.

Tasso Jereissati governou por um mandato (ainda pelo PMDB), depois Ciro, depois Tasso por 2 mandatos; e, finalmente,  Lúcio Alcântara. Sim, na época o mutante Ciro Gomes era do PSDB, os tais tucanos tão execrados pelos petistas e seus congêneres.

Uma métrica importante quando se debate a questão social é a Mortalidade Infantil, indicador que está relacionado à precariedade do saneamento básico, falta de educação sanitária dos pais, altos níveis de pobreza e penúria da saúde pública. Além disso, costuma ser uma métrica pouco manipulável, ao contrário de diversos outros indicadores.

Nesse sentido, o verbete sobre Ciro Gomes no Wikipedia declara como grande feito social do seu governo:

“Redução da mortalidade infantil: Como governador, reduziu em 32% a taxa de mortalidade infantil no Ceará e Programa Viva Criança recebeu o Prêmio Maurice Paté da Unicef, entregue em Nova Iorque. Foi o primeiro governante latino-americano a receber o prêmio”

Ciro assumiu o governo em 1991 e saiu perto do final de 1994, um pouco antes do final do ano, por conta da desincompatibilização eleitoral.

Infelizmente, no Brasil é muito difícil achar dados confiáveis, mas terminei chegando a uma compilação de dados de Mortalidade Infantil entre 1985 e 2000, baseada em estudos do IBGE.

Considerei o valor da mortalidade infantil em 1990, último ano no Ceará antes do governo Ciro Gomes versus 1994, que foi o ano de eleição de Tasso Jereissati.

Em termos de redução de Mortalidade Infantil nesse período, Ceará se posicionou com 14,1% de redução ficando em 11º lugar do Brasil.

Na frente estão Pará, Minas (Hélio Garcia), Tocantins, Mato Grosso, Rio de Janeiro (Brizola), Paraíba(Cunha Lima), Alagoas (Geraldo Bulhões), Distrito Federal (Joaquim Roriz) e Paraná (Roberto Requião).

Entre parênteses, estão alguns nomes de governadores que não ficaram nada famosos como agentes de redução da Mortalidade Infantil!

A posição do Ceará no ranking é bem mediana, se levarmos em conta que Roraima, Rondônia e Amapá acabaram de sair do status de território. De fato, esses estados estão perto dos últimos do ranking. O último foi Roraima.

Outro ponto relevante é que quanto mais alto o patamar inicial de mortalidade infantil, mais fácil é criar políticas que o reduzam percentualmente mais rápido.

O Ceará tinha a 6ª pior mortalidade do Brasil. Dos 5 estados piores que ele, apenas o Maranhão teve redução menor que o Ceará e também por pouco (13,8%) o Rio Grande do Norte. Os piores estados do Brasil, Alagoas e Pernambuco, tiveram reduções maiores do que o Ceará.

Comparando com o resto do Nordeste, o Ceará também foi um pouco melhor (14,1%) que a média (13,9%), ficando atrás de Sergipe, Paraíba e Alagoas, embolado com Pernambuco e a frente de Rio Grande do Norte, Bahia, Maranhão e Piauí

Agora vamos analisar o ranking durante a primeira gestão de Tasso, que até hoje é do PSDB.

No primeiro mandato entre 1986 (ano anterior) e 1990, Tasso reduziu bem mais que o Ciro (20,3%), mas ficou em posição pior (18º) porque estados como Minas, Tocantins e Rondônia tiverem desempenho excepcional (acima de 25% de redução).

No Nordeste, o Ceará ficou um pouco melhor (20,3%) que a média (20%): Rio Grande do Norte e Paraíba foram melhores, Bahia e Sergipe ficaram embolados, e Pernambuco, Maranhão, Piauí e Alagoas foram piores. Alagoas, o pior de todos, foi governado por Collor, o caçador de marajás.

No segundo mandato do Tasso, que correspondeu ao segundo mandato do FHC, período em que houve um período ruim para a economia brasileira, com a indigestão do rebote do Plano Real no dólar e das crises internacionais de 1997 e 1998, o Ceará ficou em 10º lugar, um pouco melhor no ranking que a gestão Ciro, mas com uma redução absoluta menor (9,7%).

No Nordeste, Ceará foi um pouco melhor que a média (9,6%), Alagoas e Sergipe foram melhores, Pernambuco embolado; Bahia, Piauí, Maranhão, Rio Grande do Norte e Paraíba foram piores.

O campeão de redução foi Alagoas com queda de 16,7%. O governador foi um tal de Divaldo Suruagy!

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Enfim, essa história de colocar o Ciro como campeão de redução da Mortalidade Infantil no Ceará durante sua gestão como governador, com direito inclusive a prêmio da Unicef, é mais uma trunfo do seu marketing político (virando um tipo de fake news com ares de verdade) do que algo que corresponde a qualquer resultado excepcional que o fizesse merecedor de tal homenagem.

Ciro: Desconstruindo lendas

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