'Olho por olho, dente por dente' seria um bom princípio?




Vítima de linchamento nos EUA em 1889
Vejo muitos defendendo como correta a atitude dos dois rapazes, que tatuaram recentemente na testa de um adolescente problemático de 17 anos a frase “Sou ladrão e sou vacilão” em função de ele aparentemente ter tentado roubado uma bicicleta.

Esses defensores estão sendo muito ingênuos.

Só para efeitos argumentativos, vamos partir do pressuposto que seria correta a lei de Talião:
  
Olho por olho, dente por dente.

Justiça com as próprias mãos!

Assim, um assalto seria um motivo justo para um espancamento e, quiçá, um linchamento completo.

Se assim fosse, rapidamente voltaríamos à barbárie.

Qualquer desafeto de um grupo pode ser falsamente acusado de um assalto e ser preventivamente assassinado por esse grupo. E o morto não estaria mais nem entre nós para se defender.

Seria a volta do Velho Oeste. Não teríamos segurança pública nenhuma. Tudo se resolveria com milícia, pancadaria e tiro.

Como existe a presunção da inocência, seria necessário provar que os autores do linchamento cometeram um ato injustificado, ou seja, que a vítima não cometeu um crime.

Sabemos que é muito mais difícil provar acima de qualquer dúvida que alguém não fez alguma coisa.

É muito mais fácil provar que existe um corvo preto do que provar que não existe um corvo roxo. Seria preciso coletar todos os corvos do mundo nos mais remotos recantos e mostrar que nenhum deles é roxo.

Portanto, em vista da impunidade, linchamentos se tornariam extremamente comuns. Se alguém namora uma jovem sem autorização dos pais, os pais podem incitar vizinhos, a partir de qualquer lorota, e pronto: teríamos mais um “bandido” morto.

Imagine também qualquer pessoa, com estereótipo de meliante, andando um pouco mais rápido na rua. Basta um gaiato gritar “pega ladrão” para atrair outros passantes com sede de sangue e, em pouco tempo, teríamos uma multidão ensandecida matando um sujeito, sendo que a história toda veio do nada.

Suponha agora que a família de um linchado desses, que sabe que foi injustamente vitimado, resolvesse linchar os linchadores.

Temos a mesma questão em loop. Seria difícil condenar os linchadores dos linchadores.



Alguns mais “conscientes” gostariam de restringir a permissão de matar bandidos apenas à corporação policial, como se ela tivesse acima do bem e do mal.

Mesmo se concordássemos com a tese de que bandido bom é bandido morto, isso não funcionaria.

Na prática, se a polícia tivesse uma permissão oficial de matar, a corrupção policial iria ser elevada a níveis estratosféricos. Teríamos um crime organizado com chancela oficial.

Seria elementar a polícia de madrugada pegar duas rapazes saindo de uma boate, extorqui-los e se  eles não “cooperassem”, um policial poderia matá-los à sangue frio, alegando que a dupla seria de bandidos que portavam drogas, que podem ser facilmente plantadas em seus bolsos.

Novamente o ônus da prova estaria em provar que os dois indivíduos não eram bandidos.



É isso mesmo que os partidários de Bolsonaro gostariam para a nossa Sociedade?

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